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Superendividamento: uma nova proteção ao consumidor e o direito de recomeçar

Publicado há 3 dias - Por GMFT Advocacia


GMF&T Convida 
Artigo Jurídico
Direito do Consumidor 
Por: Cinthia Amorim

O superendividamento tem se intensificado e se tornando uma realidade cada vez mais comum no Brasil. Milhões de consumidores, mesmo agindo de boa-fé, acabam contraindo dívidas que comprometem não apenas sua renda, mas também sua dignidade, chegando ao ponto de não conseguirem garantir nem o mínimo necessário para sobreviver. Considerando esta realidade, a Lei nº 14.181/2021, conhecida como Lei do Superendividamento, trouxe mecanismos que alteraram o Código de Defesa do Consumidor (CDC) e o Estatuto do Idoso (EI). Essa legislação tem como principal objetivo implementar meios mais eficazes para prevenir e tratar o superendividamento, assegurando maior proteção ao consumidor.

Um dos avanços trazidos pela nova norma é o reconhecimento do “mínimo existencial”, ou seja, a garantia de que o consumidor não será privado dos recursos essenciais para viver com dignidade, mesmo enquanto busca quitar suas dívidas. Esse conceito está diretamente relacionado à Dignidade da Pessoa Humana, princípio fundamental previsto no art. 1º, inciso III, da Constituição Federal de 1988 (CF/88). A lei aplica esse princípio de maneira prática, permitindo que o consumidor renegocie suas dívidas sem comprometer sua sobrevivência básica.

Com a legislação, os fornecedores de crédito – como instituições financeiras, empresas de crédito e prestadores de serviços – passaram a ter novas obrigações, previstas especialmente a partir do art. 54-A do CDC. Esses agentes devem atuar com maior responsabilidade na concessão de crédito, observando os Princípios da Transparência, da Equidade e da Boa-fé, sobretudo quando lidam com consumidores vulneráveis, como idosos e analfabetos, conforme destaca o art. 54-C. De igual modo, a lei também reforçou a proibição de práticas abusivas, como a publicidade enganosa e a omissão de informações essenciais nos contratos de crédito. Outro ponto essencial da legislação diz respeito à  participação ativa dos credores nos processos de renegociação de dívidas. As instituições devem comparecer às audiências, fornecer dados claros sobre os débitos e colaborar na construção de um plano de pagamento viável, que se encaixe na realidade financeira do consumidor. Não havendo acordo entre as partes, o art. 104-A do CDC permite que seja realizado um plano de pagamento compulsório, com base na capacidade econômica do devedor. Essa medida garante que as dívidas possam ser quitadas de forma gradual e realista, sem agravar ainda mais a situação do consumidor.

Vale ressaltar que nem todas as dívidas se enquadram no processo de repactuação previsto pela lei. A proteção é voltada para dívidas de consumo, como as relacionadas a cartão de crédito, empréstimos pessoais, financiamentos e compras a prazo. Ficam excluídas, por exemplo, as dívidas assumidas de forma fraudulenta, com má-fé ou com a intenção deliberada de inadimplência, assim como os débitos oriundos de compras de bens de luxo e alto valor, que não se enquadram no consumo essencial.

A Lei do Superendividamento representa um avanço na defesa dos direitos do consumidor no Brasil, pois, além de ser uma questão social, exige uma abordagem que abarca os aspectos jurídico, econômico e humano. Ao estabelecer regras mais justas para a concessão de crédito e oferecer ferramentas eficazes para a renegociação de dívidas, a legislação busca restaurar o equilíbrio nas relações contratuais, reforçar a função social do crédito e promover um recomeço financeiro para quem caiu no endividamento por necessidade ou desinformação.

Para os consumidores, a mensagem é clara: é possível sair do vermelho com dignidade, com o amparo da lei e, sempre que necessário, com o apoio de orientação jurídica especializada.

Cinthia Emanuelle Amorim de Lucena.
Advogada Associada GMF&T

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei nº 14.181, de 1º de julho de 2021. Altera a Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor), e a Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003 (Estatuto do Idoso), para aperfeiçoar a disciplina do crédito ao consumidor e dispor sobre a prevenção e o tratamento do superendividamento. Diário Oficial da União, Brasília, 1 jul. 2021. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/l14181.htm

BRASIL. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Código deDefesa do Consumidor. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 12 set. 1990. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078compilado.htm

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